terça-feira, 31 de maio de 2016

Crítica - Truque de Mestre: O 2º Ato



Quando escrevi sobre o primeiro Truque de Mestre (2013), falei como uma premissa interessante era desperdiçada por um texto que se julgava mais inteligente do que realmente era (e, apesar disso, ainda tratava o público feito idiota) e uma direção pouco inspirada. Imaginei que esse segundo ao menos tentaria melhorar os problemas do primeiro, principalmente com a saída do medíocre Louis Leterrier da direção. Tudo bem que seu substituto, John M. Chu, que conduziu G.I Joe: Retaliação (2013), é igualmente insípido, mas esperava ao menos um mínimo de esforço em realizar algo bacana. Ledo engano. Este Truque de Mestre: O 2º Ato é uma daquelas continuações que repete tudo do original, mas tenta fazer "maior" o que apenas torna maiores os problemas do filme anterior.

A trama se passa dois anos depois do primeiro, os mágicos conhecidos como Os Cavaleiros estão escondidos, esperando o momento em que a misteriosa entidade/organização conhecida como O Olho volte a chamá-los para mais uma trabalho. O que os ilusionistas não imaginavam é que seu antigo inimigo Thaddeus Bradley (Morgan Freeman) estava tramando sua vingança por ter sido preso no filme anterior. Ao mesmo tempo, também são pegos no encalço do misterioso empresário Walter (Daniel Radcliffe) que deseja a colaboração do grupo.

Pela bilionésima vez Freeman se reduz a uma paródia de si mesmo e faz um personagem cuja função é dar explicações e mastigar os temas do filme para o público. Seu personagem praticamente não tem um arco dramático e quando ele entra em cena é para explicar algo que acabou de acontecer ou mesmo o que se passa na cabeça de algum personagem (que muitas vezes nem está próximo dele, o que não faz muito sentido). Além de explicar aquilo que podemos obviamente ver que está acontecendo na tela, o personagem de Freeman também se entrega a longuíssimos solilóquios com sua voz serena e pausada de narrador do National Geographic sobre o poder da ilusão e como o olhar pode ser engano e coisa e tal. Lá pela terceira vez que ele dá um desses discursos rocambolescos que dão voltas em si mesmos como um cão atrás do próprio rabo eu simplesmente tive vontade de atear fogo no cinema e cada vez que ele entrava em cena eu revirava os olhos em tédio.

Pior que o excesso de explicações é o fato de que a maioria das coisas sequer precisa ser explicadas, já que muita coisa fica óbvia de cara. Um exemplo é na primeira fuga dos mágicos, na qual eles descem por um túnel cheio de luzes e uma voz que os manda dormir, na cena seguinte eles acordam nos fundos de um restaurante em Macau na China e o filme tenta construir uma aura de mistério em torno de como chegaram ali e vai nos dar três cenas em que os acontecimentos são explicados aos personagens (e a nós). A questão é que a cena já deixava claro que eles tinha sido hipnotizados e levados de avião para a China, mas o filme se julga tão esperto e seu público tão burro que acha necessário repetir a mesma explicação várias vezes para garantir nosso entendimento.

Outro momento que deixa claro o pedantismo do produto é quando eles precisam roubar um chip de um complexo industrial cheio de seguranças e coloca como obstáculo um detector de metais. Ao invés de usar um detector de metais similar aos que vemos em aeroportos ou qualquer outro lugar, o filme traz um vão amplo que exibe um imenso brilho verde ou vermelho (acompanhado por um alarme barulhento) ao realizar seu diagnóstico e a sensação que fica é que os responsáveis por esse filme acharam que não seríamos capazes de discernir se os personagens estavam liberados ou não para passar sem que o filme acendesse uma luz enorme na nossa cara para que não houvesse dúvida.

Quando as revelações não são óbvias, são pra lá de previsíveis e telegrafadas com enorme antecedência para o público apesar do filme achar que está fazendo um excelente trabalho em nos despistar. Em um dado momento, Dylan (Mark Ruffalo) recebe um relógio que seu falecido pai tinha guardado para ele e o close dado no objeto torna evidente que ele será importante na cena seguinte, assim quando ele é preso em um cofre e jogado no mar minutos depois, sabemos que o relógio será a chave para ele sair da situação. Desse modo, o que deveria ser uma fuga audaz e surpreendente é esvaziado de emoção e suspense porque o filme berrou a resolução na nossa cara muito antes dela acontecer.

O filme pesa tanto a mão em insistir nos dar uma reviravolta a cada cena que muitas delas sequer fazem sentido. Em uma cena Dylan e Thaddeus estão na China procurando os Cavaleiros e Dylan aborda uma senhora chinesa fazendo perguntas em inglês e a mulher não entende o idioma. A seguir Thaddeus repete em chinês a pergunta feita e consegue a informação, indagando a Dylan se não está surpreso por ele falar chinês e o personagem de Ruffalo simplesmente diz em chinês que o sotaque dele é terrível. Ora, se Dylan era fluente em chinês porque não fez logo a pergunta no idioma ao invés de tentar fazer uma chinesa, na China, entender inglês? E o que aconteceria se Freeman não falasse chinês, Dylan ficaria lá por horas tentando se comunicar com a mulher? A resposta a todas essas perguntas é que o filme está tão preocupado em nos surpreender e virar nossas expectativas ao avesso o tempo todo que atira pela janela preceitos básicos de narrativa como coesão ou lógica causal, fazendo personagens que deveriam ser inteligentes se comportarem como completos idiotas.

O excesso de idas e vindas, de alianças feitas e desfeitas e revelações bombásticas em cima de revelações bombásticas acaba nos levando a não nos importarmos com o que acontece, já que tudo que acabou de acontecer será imediatamente desfeito pela cena seguinte e assim sucessivamente deixando no ar uma sensação de que "vale qualquer coisa" e que os roteiristas pensaram mais nas reviravoltas do que em criar uma história minimamente envolvente. Inclusive a revelação final de Thaddeus faz tudo que aconteceu ao longo do filme parecer uma enorme perda de tempo, já que a rusga entre ele e Dylan podia ser resolvida com meia dúzia de palavras e o veterano mágico podia facilmente tê-lo alertado sobre a ameaça de Walter.

Nosso engajamento ainda é prejudicado pela superficialidade dos personagens, pois apesar de acompanharmos o grupo por dois filmes, sabemos muito pouco sobre eles além de suas especialidades em magia e o fato de serem egocêntricos. Dylan talvez seja o único com um mínimo de construção, mas seu arco aqui é exatamente o mesmo do primeiro, com ele tentando reparar o que aconteceu com o pai. As novas adições ao elenco são igualmente desinteressantes. O vilão interpretado por Daniel Radcliffe é um "empresário do mal" genérico, o irmão gêmeo de Merrit (Woody Harrelson) aborrece mais do faz rir, um vilão do primeiro retorna sem muito impacto, já que não nos importávamos com ele antes e o atual filme não nos dá muitas razões para se importar com ele agora. Lizzy Caplan é a nova integrante dos Cavaleiros como Lola, mas ela é reduzida a um alívio cômico cujas piadas nem sempre funcionam.

O filme ainda traz duas cenas ação, uma luta num mercado chinês e uma perseguição em Londres, mas lhes falta energia e criatividade. Além disso a câmera constantemente trêmula e a montagem epilética transformam esses momentos em uma enorme bagunça incompreensível. Tudo bem que na parte da perseguição os personagens queriam enganar os inimigos, mas existem outros meios de convocar isso sem parecer que a coisa toda foi mal filmada e mal montada. Isso sem falar no instante risível em que uma moto se choca com um carro e imediatamente começa a pegar fogo, o que aconteceria somente se ela estivesse toda besuntada em gasolina. O único momento realmente interessante e com alguma tensão é a cena em que eles escondem um chip numa carta de baralho e a passam um para o outro tentando evitar a revista dos guardas, mas o filme acaba alongando a cena mais do que deveria e o que começou divertindo vai aos poucos se tornando maçante.

Truque de Mestre: O 2º Ato não é apenas uma continuação preguiçosa, vazia e repetitiva. Ele também faz questão de insistir nos mesmos problemas de antes ao construir uma trama que se considera mais esperta do que realmente é, alheia a sua própria estupidez e incapaz de criar uma atmosfera de suspense ou incerteza que consiga envolver.


Nota: 3/10

Trailer:

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