quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Crítica - A Visita

Análise A Visita

Review A Visita
Depois de estrear com ótimos filmes como O Sexto Sentido (1999) e Corpo Fechado (2000), o cineasta M. Night Shyamalan cavou uma vala para si mesmo ao engatar uma série de fracassos de público e crítica a partir do praticamente indefensável A Dama na Água (2006) que tornou ele um sinônimo tão grande de fracasso que seu nome chegou a ser omitido nos materiais de divulgação de seu filme anterior, o execrável Depois da Terra (2013). Assim chegamos a este A Visita, que finalmente nos lembra o quanto ele pode ser bom, apesar de ainda apresentar muitos problemas similares a trabalhos anteriores.

A premissa é bem simples, os adolescentes Becca (Olivia DeJonge) e Tyler (Ed Oxenbould) vão viajar para passar uma semana na casa dos avós que moram no interior dos Estados Unidos e que eles nunca conheceram. A ideia de Becca é usar a viagem para filmar um documentário sobre sua família e tentar dissipar um rancor antigo que sua mãe (Kathryn Hahn) tem com os pais. Ao chegarem na fazenda dos avós, no entanto, coisas estranhas começam a acontecer e os irmãos começam a acreditar que os avós estão guardando algum segredo tenebroso. 

O filme é todo mostrado através das filmagens de Becca e Tyler, como um tradicional exemplar do terror found footage. A questão é o diretor faz várias escolhas que parecem incoerentes com o formato, isso vai desde o surgimento dos créditos iniciais na tela, quebrando a ilusão da "farsa" que esses filmes tentam estabelecer, passando pelo uso do som. Perfeitamente captado, ouvimos com clareza a fala de todos os personagens mesmo quando eles estão distantes da câmera e não há qualquer microfone por perto para captar o áudio. A imagem também é incrivelmente limpa e perfeitamente fotografada, algo que não condiz com imagens captadas por uma amadora, por melhor que seja a qualidade de seu equipamento. Sei que ao falar de filmes desse tipo, como A Forca e A Possessão do Mal, constantemente reclamo do excesso de imagens carregadas de interferência, câmera epilética e som pouco equalizado, mas aqui tudo é conduzido como uma ficção tradicional na qual os personagens esporadicamente interagem com a câmera e não um found footage e a insistência de Shyamalan no formato não faz muito sentido, podendo ter sido tranquilamente um filme "normal" sem alterar nada.

Dito isso, Shyamalan volta a criar a atmosfera aterrorizante e imagens arrepiantes que seus últimos filmes davam a entender que ele tinha esquecido como fazer e em muitos momentos ele cria sustos genuínos que te fazem pular da cadeira. Ele vai aos poucos construindo a impressão de que há algo errado com o casal de idosos e a partir da primeira noite, quando Becca vê a avó (Deanna Dunaga) vomitando pela casa, as tensões vão aumentando gradativamente até o intenso e sangrento terceiro ato. Algumas cenas são incrivelmente tensas, como o esconde-esconde sob a casa, ou os dois momentos em que a avó pede que Becca entre no fogão para limpá-lo.

Outros momentos funcionam pelo puro aspecto tenebroso das imagens, como a avó correndo loucamente pela casa ou o momento em que ela fica nua e começa a arranhar as paredes. Alguns momentos de humor ajudam a aliviar um pouco as coisas, em especial as tentativas desengonçadas de Tyler em fazer rap freestyle, mas algumas vezes a inserção das piadas em cima dos momentos de terror acaba quebrando um pouco a atmosfera, como o momento em que Tyler vê a avô nua batendo nas paredes, algo bastante macabro, e ele comenta "estou cego!", imediatamente quebrando o terror da cena. Por vezes o humor acaba também soando de mau gosto, quando os irmãos tentam fazer graça com as fragilidades físicas e mentais típicas de pessoas idosas e qualquer um que tem ou teve algum parente sofrendo com qualquer tipo de demência ou condição degenerativa sabe o quanto isso é verdadeiramente degradante e pouco se presta a comédia. Tudo bem que uma reviravolta final torna as brincadeiras dos irmãos um pouco mais aceitável, mas no momento em que as vemos elas soam incomodamente cruéis.

Há também uma questão de drama familiar e reparação de traumas conjuntos, algo que é uma constante na filmografia do diretor, mas nem sempre convence. Aqui acaba funcionando graças à qualidade do elenco que forma o núcleo familiar (Becca, Tyler e a mãe), que possuem uma ótima química juntos e convencem como uma família unida, mas levemente disfuncional.  O problema é o modo puramente expositivo e didático que os conflitos e traumas são abordados, sempre em longos monólogos com os personagens falando diretamente ao público e explicam sem nenhuma sutileza todos os seus problemas, mastigando a "moral da história" ao público. Tudo é dito, explanado, mas pouco é vivido ou experimentado, sabemos desses problemas porque os personagens nos falam deles o tempo todo, mas o filme não nos dá o devido espaço para percebermos isso, sempre nos entregando tudo através de longas explicações.

Mastiga também as próprias escolhas do diretor ao longo do filme ao trazer diálogos metalinguísticos entre Becca e Tyler sobre como compor os planos de um filme ou o momento em que ela diz detestar pieguice. É quase como se Shyamalan quisesse se proteger de antemão de possíveis detratores, interditando qualquer possível objeção que se tenha ao seu filme como uma "falha" da audiência. Um expediente covarde e desonesto que o diretor já tinha usado em A Dama na Água, no qual ele se coloca como alguém infalível e joga para o público a culpa por não aderir à sua obra, apelando para o velho e pobre argumento de "quem não gostou, não entendeu". Quem acompanha o meio ou já viu ou assistiu qualquer entrevista dele sobre seus recentes fracassos sabe como ele sempre se põe como incompreendido ou injustiçado, vítima de estúdios sem escrúpulos, críticos cínicos e um público acomodado. Se isso fosse apenas uma postura pública, não haveria problemas, afinal obra é obra e realizador é realizador, mas ao levar esses expedientes imaturos e mesquinhos para dentro de seus filmes, tudo que o diretor consegue é depreciar os próprios méritos.

Dito isto, A Visita é um filme de terror bem eficiente e mostra como Shyamalan ainda é capaz de fazer coisas interessantes, apesar de ainda trazer muitos dos problemas que o levaram ladeira abaixo.


Nota: 7/10

Trailer do filme:


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