terça-feira, 15 de julho de 2014

Crítica - Juntos e Misturados

Acho que já falei isso, mas nos últimos anos sempre que via a vinheta da Happy Madison (produtora de Adam Sandler) ficava com dois pés atrás em relação ao que veria seguir. Não um temor injustificado, já que o últimos projetos do comediante resultaram em porcarias homéricas como Gente Grande 2 (2013) e Esse é o Meu Garoto (2012) e Cada um Tem a Gêmea que Merece (2011). Este Juntos e Misturados, no entanto, parecia um pouco mais promissor ao trazer de volta a parceria de Sandler com Drew Barrymore, que rendeu suas melhores comédias, Como Se Fosse a Primeira Vez (2004) e Afinado no Amor (1998). Embora não chegue a ser desastroso como os esforços recentes do comediante, o filme lamentavelmente fica aquém dos outros produtos da parceria Sandler/Barrymore.

Na trama, Laura (Drew Barrymore) é uma mulher recém-divorciada e mãe de dois filhos que topa um encontro às cegas com Jim (Adam Sandler), um viúvo que tem três filhas. O encontro é um desastre e eles concordam em não se verem novamente. O destino, entretanto, intervém quando ambos compram o mesmo pacote de férias familiares na África e são obrigados a ficarem juntos. Como é de se esperar, aos poucos ele se aproximam, percebem como precisam um do outro e daí já é possível prever o que acontece.

O problema nem é tanto a história clichê, mas o olhar arcaico e anacrônico que por vezes lança sobre as relações familiares, traçando papéis claros para o homem e para a mulher e definindo o que são atividades “de menina” e “de menino”. Ora, Jim precisa de Laura porque ele, enquanto homem, não conversa com suas filhas sobre menstruação ou namorados, como se apenas uma mulher pudesse educar uma filha acerca disso. Já Laura, por ser mulher, não sabe como conversar com seus filhos sobre masturbação ou esportes, afinal isso é claramente papel exclusivo de homens e uma mulher é incapaz de entender isso afinal eram os anos 50 e...espera um pouco, o filme não se passa há 40 anos atrás, mas nos dias de hoje, onde essa perspectiva de papéis de gênero soa tola e preconceituosa.

Mais lamentável ainda é que o filme tente usar isso para fazer graça, como na cena em que Jim e o histérico cantor do resort (Terry Crews) ridicularizam um garoto que acabou de perder um jogo de basquete para a filha de Jim, como se uma mulher não pudesse praticar esporte ou fosse algo tão inferior que sua vitória seria uma grande humilhação para o homem derrotado. Isso não é engraçado, é machista e se me disserem que esse tipo de brincadeira é normal, mesmo fora da ficção, diria que isto não torna a ação mais aceitável, revelando apenas a naturalização de certos preconceitos, um preconceito que o filme endossa ao invés de questionar.

Apesar desse olhar antiquado e anacrônico, o filme acerta na química entre o elenco principal, que convencem como chefes de suas respectivas famílias e o modo orgânico e crível como eles e seus filhos vão se aproximando. Isso também se estende ao elenco infantil e jovem, algo raro neste tipo de filme, em especial as filhas de Jim, que tem arcos dramáticos mais definidos, enquanto que os filhos de Lauren, apesar do carisma, ficam presos em piadas repetitivas de pancadas na cabeça e masturbação. Os jovens atores defendem bem seus papeis, como vemos na tocante cena em que a filha do meio de Jim lhe fala sobre a mãe ou o modo como as gracinhas da filha mais nova são realmente divertidas e não soam forçadas.

Infelizmente os coadjuvantes não possuem o carisma do elenco principal, se restringindo a tipos rasos que repetem constantemente os mesmos gestos e frases de efeito como se saídos diretamente do Zorra Total, como a vexatória participação do ex-astro de basquete Saquille O’Neal como o colega de trabalho de Jim. O mesmo ocorre com casal de hóspedes interpretado por Kevin Nealon (que mesmo no SNL era sem graça) e Jessica Lowe, que tornam cada segundo em que estão em cena em um exercício de paciência com piadas forçadas ou tentativas rasteiras de intervenção dramática. Até o habitualmente engraçado Terry Crews (o pai de Todo Mundo Odeia o Chris) tem uma presença irregular como o exagerado cantor do resort, cuja presença funciona em alguns momentos e em outros nos faz revirar os olhos.

Além disso o filme se alonga mais do que deveria, criando conflitos e desencontros desnecessários em seu terceiro ato, sendo que a trama poderia ser resolvida ainda durante a viagem. Tudo bem que é compreensível a hesitação do viúvo Jim em embarcar num novo relacionamento, mas trazer de volta o ex-marido de Laura apenas para ele ser rapidamente rejeitado não agrega nada ao filme.

No fim das contas, Juntos e Misturados contrapõe cada momento de emoção e graça genuínas com outros irritantes e repreensíveis, sendo uma comédia dramática que nunca acerta totalmente nem o tom da comédia nem o do drama.


Nota: 5/10

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